quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Meu espelho

Você já parou para pensar em quem é você hoje? No fim do expediente, quando as forças fraquejam, quando o cabelo está despenteado, quando um banho morno e um par de pantufas podem significar o maior dos desejos... quem é você? Quais seus valores, seus defeitos, suas virtudes? De onde você veio, e para onde está indo?

Eu posso ser um preguiçoso às 6 horas, quando o dia está raiando e muitos ainda dormem. Duas horas depois, sou alguém que admira os raios de sol, a beleza da grama molhada, as crianças que correm na rua porque estão atrasadas para a escola. Às 10 horas, quem sabe, sou um marombeiro ferrenho, que pedala veloz, que sua para perder as calorias acumuladas às custas de barras de chocolate e salgados fritos.

No início da tarde, quero ser forte. Quero ter pensamento ágil, perguntas feitas, histórias para contar. Ao fim do dia, sou um ser em busca de inspiração para preencher linhas e páginas com aquilo que pode mudar a rotina das pessoas. À noite, quem sou eu? Ah, não posso me esquecer, sou um resmungão de marca maior, que se queixa da dor de cabeça, dos telefonemas não atendidos, da lentidão das máquinas e do ônibus.

Quem sou? Às vezes não sei. Ou finjo não saber. Talvez esconda até de mim. Mas há dias em que sinto saudade de ser só aquela criança que comia bombons, escondido, na despensa da casa da madrinha, que brincava no quintal com bonecos de seriados japoneses, que, entre agulhadas e exames, sorria para as pessoas e podia rir e chorar sem medo do julgamento.

Ai, que saudade de mim. E você, que aqui chegou... quem é?

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

E se houver sinais?

E se, de repente, eu me olhar no espelho e não for mais eu?
Se cair de moto
Se pular um muro
Se enfrentar as ondas
Se enxergar no escuro

E se, de repente, eu buscar palavras no meu íntimo silêncio?
E correr mais riscos
E assumir os quilos
E acordar cantando
E chorar baixinho

E se, de repente, eu me apaixonar?
Pelos livros
Pelos animais
Pelos acordes
Pelos números

E se, de repente, eu me cansar?
De fazer dieta
Das palavras certas
De pessoas instáveis
Da minha própria sombra

E se, de repente, eu não quiser mais chocolate
E se, de repente, eu não aceitar amarras
E se, de repente, eu desaparecer do mundo
E se, de repente, não for mais tão de repente...

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Tenho pena de Deus

Tenho pena de Deus. É, é isso mesmo. Me peguei pensando, há uns dias, em quantas vezes o desafiei a atender meus pedidos na hora em que eu queria. Perdi os cálculos. Desde pequeno, tive um pezinho na chantagem emocional, mesmo que fosse com o Todo-Poderoso. Então, do alto da minha pequenez, dizia: "- Se você existe mesmo, então me prova e me dá isso". Às vezes funcionava.

É, funcionava, e eu ria à toa quando alcançava meus pedidos autoritários, como se meu canal direto com Deus fosse algo como uma "linha vermelha", sem sinal de ocupado. Os pedidos variavam de "- Quero ganhar uma mochila nova" a "- Fala fulano sumir do meu caminho!". Ah, outro detalhe: a convivência em comunidade era um desafio para mim, até a adolescência.

Criado como um reizinho mandão, em que a casa girava ao meu redor e todos os pedidos eram satisfeitos pela família, acostumei-me às mordomias. Se queria um brinquedo novo, era só pedir. Nos inúmeros exames de sangue que fiz, a condição para aceitar as agulhadas era ganhar algo em troca. Certa vez, vovó pagou-me R$ 50 para que eu fosse ao laboratório. Tá, ela que usou para comprar algo, mas, lá no fundo, o ego falava mais alto. "- Consegui!".

De uns tempos para cá, parei de apostar com Deus. Perdeu o sentido a minha impáfia, de modo que, este ano, decidi que seria meu o que eu merecesse. Então, "- Se Deus quiser...", a vida caminha. E não é que tem caminhado? Mudei de emprego, tenho aprendido muito, financiei o apartamento para o meu irmão, ganhei um (sonhado) prêmio, tenho minha avó com saúde ao meu lado, fiz novos amigos... e nem chantageei os céus!

Dizem por aí que Ele escreve certo por linhas tortas. De certo modo, de escrever eu entendo (cof cof cof), mas às vezes custa-me entender a caligrafia divina. Pobre Deus, deve escrever tão rápido, que a letra sai pior que receita médica. E enquanto eu, pequeno, perco meu tempo indagando a veracidade das escrituras, Ele escreve depressa e enfrenta a tendinite (deve ter, né?!) para dar-me próximas linhas.

Espero que tarde meu ponto final.

Simples assim...

Tenho ensaiado a volta ao mundo das palavras que traduzem o que penso, mas confesso que não passam de duas linhas certas coisas que quero dizer. Talvez não por falta de vontade, mas por medo de permitir, de uma hora pra outra, que todos meus pensamentos aflorem. Tenho estado inconstante nas últimas semanas...

Uma coisa é certa, e até publiquei algo lá no meu Facebook: estou me dando conta de que já existem muitas complicações na vida para eu perder tempo tentando explicar os outros (e explicar-me aos outros). Já há tanta briga política escondida em corredores escuros do poder, tantos acordos sendo fechados por pura conveniência, incontáveis mentiras sendo ditas por aí com fantasia de verdade. Pra que ficar caçando dificuldade por aí?!

Tenho meus dias de nuvens cinzas, de mal-humor matinal, uma ranhetice com os quilos a mais que ganhei nos últimos meses. Guardo comigo algumas passagens desagradáveis, medos inconfessáveis, frustrações pessoais e profissionais. Mas são coisas que ficam trancadas no baú dos sentimentos e das lembranças. Não preciso enegrecer o mundo com o que não gosto ou com tudo aquilo que me angustia.

É melhor abrir a janela da alma para ver que o céu é azul, que os amigos são extensões do coração que decidimos plugar a nós mesmos, que o amor pode ser simples, corajoso e saboroso e, principalmente, que ao final do dia o cansaço não é impedimento para sorrir.

Levar uma vida mais leve é questão de escolha. De saber escolher onde estar, com quem estar, e por quanto tempo ficar. Então, decidi uma coisa: quero estar presente onde eu me sinta bem; onde haja desafios para enfrentar, ao lado de amigos nos quais eu possa confiar e, principalmente, perto do meu porto-seguro, nos braços de quem eu amo, para poder descansar. Simples assim.