Palavra recorrente nas redes sociais: desapego. Perdi as contas de quantas vezes a li, escrita por amigos, familiares, conhecidos. Invariavelmente, colocada da seguinte forma: "- Vou praticar o desapego". Ou, para os menos enfáticos, "- Preciso aprender a praticar o desapego". Tenho certeza que não estou sozinho nesse voyeurismo dos desapegados virtuais.
Eu até gostaria de ser mais desapegado. Dos meus livros de infância, de brinquedos que guardo sobre o guarda-roupa, de camisetas e bermudas que não cabem mais e insisto em manter nos cabides. Queria desapegar da minha velha TV Xuxa Cineral, que há pouco completou 15 anos; de sapatos e tênis surrados que insistem em ser confortáveis. Disso sim, dá pra desapegar.
Mas daí a dizer que quero desapegar de gente, não, não dá. Posso estar mais distante, telefonar menos, passar semanas (até meses) sem dar notícias. Mas de gente que eu gosto, não desapego. Mesmo que me faça raiva, que me irrite, que de uma hora para a outra eu a deseje morta. Desapegar? Não, isso já é demais! Preciso da chama que elas me acendem (por amor ou por ódio), aqui no peito, mesmo que em invernos de relacionamento mais pareça uma fagulha em meio à lenha já ardida.
Essa história de "praticar desapego" não tem fundamento. Primeiro, porque - penso eu! - se você chega a externar esse desejo de não apegar-se a alguém, ao mesmo tempo está mandando um recado claro: há algo que lhe incomoda, mas mesmo assim o afeto é maior. Ao bradar ao vento esse desejo de romper o elo, o desejo íntimo é, mais e mais, que o elo se fortaleça. Que os laços não se rompam. Uma coisa meio psicologia às avessas.
É como dizer "- Te odeio, não me ligue nunca mais" num término apaixonado de namoro. É claro que você quer ver a outra pessoa te telefonando e implorando seu amor! Quem nunca usou dessa tática e depois passou algumas horas agarrado ao celular esperando um sinal de vida? Se o aparelho soa, o mundo revive. Caso contrário, é hora de entrar na fase do rancor, das indagações e do súbito desejo de ver-se livre daquele sentimento. Mas ele está lá, inegavelmente. E essa luta costuma ser longa...
Dizer que vai praticar o desapego é apegar-se às memórias. Àquilo que se cultiva de mais gostoso de uma situação vivida com alguém. E, vai dizer que não?, qualquer pessoa só tenta se livrar do que é bom diante do medo de que a sua lembrança seja esquecida pelo outro lado da história.
No fim, o que se busca não é o desapego. É lembrar àquela pessoa que você ainda existe. Um remédio para o amor próprio.
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