sexta-feira, 3 de junho de 2011

Risco de queimadura

Começa com um calor no peito, um brilho diferente nos olhos, um pensamento que teima em ser pensado. Vem o suor nas mãos, uma vaidade súbita, aquele frio na barriga esperando sinais de fumaça - às vezes, torpedos, e-mails, um "cutuque" no Facebook. Pimba, é paixão!

Existindo desde que o mundo é mundo, essa tal de paixão é capaz de nos cegar. Seja quando nos apaixonamos por alguém, seja quando o encantamento se dá por um ideal. Os sintomas se repetem e, tomados de forte arroubo, defendemos o objeto idolatrado desmedidamente. Cegueira traiçoeira, nos venda os olhos com um trapo que só nos deixa um facho de luz. Justamente aquela luz quente, que aquece o coração.

Os apaixonados, ah, os apaixonados... não admitem críticas a qualquer coisa que esteja próxima de seu altar. Fagulhas incendeiam campos outrora tranquilos, pecadores se transformam em santos inveterados. Não os culpem, eles não conseguem avaliar a dimensão de seus atos. Tomados de sentimento, é como se o corpo se prolongasse para além dos limites, como se o outro - o ser amado - fosse também um pedaço seu. Conhecem e admitem, tão somente, o que sentem - o que os conquista, encanta e transforma.

Pelos caminhos tortos da vida, já conheci muitos tipos de apaixonados. Há aqueles que ouvem músicas e sentem os versos como se fossem escritos para si, que ficam aflitos à espera de um telefonema, que capricham no perfume e ficam indecisos com a roupa para "aquele" encontro. Também já vi paixões devastadoras - que estragam amizades, que rompem os limites do respeito, do diálogo, da tolerância. Em comum, a veneração desmedida, o não ver (e não querer ver) fissuras em tetos de vidro.

Paixão é coisa boa, não dá pra viver sem. Mas como a cólera, é precisa ser freada. Por mais difícil que seja, requer rédeas e freios. Pulso firme e racionalidade. Como fogo em pneus, ela atinge ápices, queima, deixa rastro que dá pra ver de longe. Mas é inevitável: passado algum tempo, a paixão vai enfraquecendo, a fumaça rareando, e ela cessa. Em seu lugar, ficam as cinzas.

Um comentário:

  1. Nem sempre restam apenas cinzas meu caro. Existem paixões que surgem para limpar o caminho e preparar o terreno onde se semeará o amor.
    Belo texto.

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